segunda-feira, 30 de abril de 2007

Segunda Feira - 30/4/2007


Primeiro, como sempre, o genérico. O tema actual dos “Morangos Com Açúcar” segue na tradição de programas como “Golden Girls”, “Cheers – Aquele Bar” e, mais recentemente, “Dawson’s Creek”, na medida em que esconde um mar de depressão atrás duma letra supostamente positiva. Os genéricos dos programas referidos são baladas, enquanto que o “Morangos Com Açúcar” utiliza um registo mais uptempo; mas partilham uma certa insistência em descrever de forma tão agressiva as virtudes da vida activa que acabam por reforçar no espectador os sentimentos de depressão que tem por não fazer parte deste mundo fictício. Assim, “thank you for being a friend” e “sometimes you wanna go/where everybody knows your name” são linhas escritas especificamente para fazer com que uma pessoa julgue não ter amigos, ou não ter amigos suficientes; enquanto o “I don’t wanna wait/for my life to be over” do “Dawson’s Creek” e o “viver/toda a energia/viver/todo o dia-a-dia” dos “Morangos” fazem chacota dos pobres bastardos que estão plantados à frente da televisão em vez de se lançarem em existências românticas tão atribuladas como as das personagens das séries. Como muitos dos melhores temas televisivos de sempre, a canção do “Morangos Com Açúcar” é um convite ao suicídio.


O episódio começa com uma situação lírica digna dos melhores livros de Hemingway: Hugo e Luz, ambos severamente ressacados, discutem numa colina a perda do selo que Luz tinha dado a Hugo como presente de aniversário do seu namoro. Hugo por sua vez presenteia a jovem amada com chocolate negro, que esta aceita entusiasticamente, notando que o chocolate negro “faz bem ao cérebro, sabias?” Logo no início do episódio, temos assim o MORANGOS FUN FACT OF THE DAY.


Passamos ao mítico Bar Azul, no qual André anda a alimentar o seu recente capricho pela atrasada mental da Leonor, enquanto Sofia distribui CDs piratas pelas gémeas. André acaba por confrontar Sofia com a sua pérfida actividade criminal, ao que ela responde que devia confiar nela e que já não é seu namorado. Mas fica no ar que ela não lhe está a dizer tudo – mal sabe André que a pirataria é o único recurso que Sofia tem para poder começar a viver uma nova vida…como homem!


Enquanto isto, ao ar livre Natasha e Duarte curtem um charro – e a erva deve ser forte, uma vez que os leva a comparar nuvens a seres e objectos da terra (o que é completamente absurdo, uma vez que nuvens são conjuntos de partículas de água condensada em suspensão na atmosfera, e portanto nada têm a haver com objectos ou animais!) Num ataque de misantropia, a doce Natasha até exprime o desejo que o seu namorado Sam “se lixe”. A seguir, damos um pequeno salto ao apartamento da nossa família disfuncional favorita (Marina, Zé Maria e Paulo), onde Marina está a exercer a sua vingança contra o nefasto Paulo com um plano deveras maquiavélico: está a bater-lhe duramente nas costas e a dizer que é uma massagem! Ah, a inteligência venenosa do sexo feminino!


Na casa dos Salgado, a mãe apanha Filipa a costurar em vez de estudar. Filipa nota que gosta de costurar e tal, a mãe entende que está bem e tal, e levanta o castigo que impedia Filipa de costurar e tal. Voltando ao Bar Azul, André diz a Leonor que devia esquecer a Sofia e convida a Leonor ao cinema. Esta reage entusiasticamente. Moral: se te comportares de modo patético o suficiente, há de haver sempre uma bimbo qualquer que alinha em dar-te um pity fuck.


A segunda parte abre com um plano próximo dum jogo de telemóvel, dando assim um (1) ponto de product placement ao episódio de hoje. Em secreto, uma das gémeas ensaia passos de dança latina com Lourenço; noutro local, a outra gémea vibra com Jota ao som dos loucos êxitos da era Disco-Sound. É revelado que estes apenas estão a ensaiar para competir num concurso de dança de forma a que a gémea possa ir numa viagem com Lourenço, mas não será que se estão a divertir um pouco demais se é apenas este o propósito? SERÁ QUE ISTO VAI LEVAR A UM POSSÍVEL SUB-ENREDO FUTURO? :-0


Rute e Leonor discutem André como possível interesse romântico de Leonor. Sofia passa por lá e tenta dar uma de antipática, mas não tem muito jeito. Mais tarde, na loja, tenta livrar-se da sua missão de infiltrada no sórdido mundo da pirataria (arrr!) e tráfico de marijuana, mas os polícias pedem-lhe para esperar mais um bocadinho (não se ouve a voz do outro lado da linha, pelo que não posso comprovar se estava a mastigar um donut.) Enquanto isto, Tânia chega a casa com um novo CD – a tia pergunta-lhe como arranjou se está com falta de dinheiro, e esta responde que “estava em promoção”, mas não menciona onde comprou, nem que disco é, pelo que me vejo forçado a tirar um (1) ponto de product placement ao episódio. Um pouco depois, Angelina descobre que Tânia possui também maquilhagem nova, “oferecida”; deduz que esta tem novo namorado.


André anuncia a Duarte a sua mãe que vai ao cinema – Duarte inquire se este tem nova namorada (perturbante, o interesse que as pessoas nesta série tomam pela vida romântica dos irmãos.) André põe-se a andar e Duarte e a sua mãe têm uma pequena discussão, que acaba em Evanescence e na promessa de Duarte de “fugir de casa” se o tentarem meter num colégio – tudo isto tem uma atmosfera calorosa de livro infantil dos anos ’50. Ao mesmo tempo, decorre o jantar na casa dos Salgado – Sofia chega e nem tem fome. Foge para o seu quarto, e a dor é tanta que só pode ser exprimida através do mais desolador recurso estilístico televisivo – o flashback. Acaba por decidir falar com André, através duns auscultadores estranhos que hão de estar ligados à Interweb ou algo (putos de hoje) mas só está lá o Duarte e, sejamos honestos, ninguém quer falar com o Duarte. Pelo telefone nem pode oferecer erva.


No dia seguinte, Rute e Leonor discutem o encontro. Leonor afirma “não se lembrar” de que filme foram ver, o que obrigar-me-ia a descontar mais um (1) ponto de product placement, mas felizmente a mala ”Hello Kitty” da Rute salva a ocasião (e já agora, desde quando é que as betas andam com Hello Kitty? Para mim parece domínio exclusivo de góticas e japanofílicas…) Numa destas tristes ironias que a vida tem, Lourenço e André discutem a falha da relação com a Sofia ao mesmo tempo que, noutra sala, Sofia discute a mesma situação com as gémeas. Ao almoço, Filipa anuncia que já pode voltar a fazer costura e tal. Natasha nota que Filipa “lhe podia fazer um top” – e apenas quem ignora totalmente o calão sexual dos emigrantes de leste em Portugal poderá pensar que esta está a falar em vestuário.


Na sala dos professores, reina a consternação sobre a manchete do ”Factual” (excelente nome para um jornal, já agora – tem sabor a “methinks the lady doth complain too much”) - “Crianças Embriagadas No Colégio Da Barca”. Vitória tenta desdramatizar a situação, notando que as pessoas sabem que os jornalistas “exageram sempre”. As professoras respondem que o ”Factual” é um jornal de nível. A julgar pela linha editorial que coloca putos que beberam sumo com álcool na primeira página, confirma-se. Enquanto isto, Marina e Zé Maria ponderam o seu destino na cantina – tal como Clint Eastwood, sabemos terem sido acusados dum crime que não cometeram. Hugo e Alex discutem as suas primeiras experiências com o alcoolismo – o consenso parece ser que dá uma dor-de-cabeça “do caraças”. Mick “Manel” Hucknall e Angelina discutem a sua relação – nas sombras, um sórdido empregado da Blackout sorri demoniacamente.


Prosseguem as aulas. Em matemática, Filipa mostra não ter feito os trabalhos-de-casa (facto comentado em sussurros pelas suas supostas amigas – agradável toque de realismo social.) Em Educação Visual, Rute e Leonor continuam a falar de André, visto que claramente não têm conversa. Mas a maior actividade decorre na aula de Português – Julieta elogia o desempenho dos seus alunos na peça de teatro, incitando aplausos por parte de alguns personagens e um sorriso confuso duma pobre figurante que teve o azar de ser captada pela câmara. Segue-se um pequeno diálogo sobre como melhor investir os lucros da peça, em que a posição da professora (“actividades desportivas”) é defrontada com a claramente superior ideia dos alunos (gelados, bolos, e “uma nova playstation para a associação dos estudantes” – isso quer dizer que já tinham uma?) Num gesto pouco abrilesco, a professora faz vencer a sua perspectiva pela pura força do mais poderoso.


Na redacção do jornal de escola, Becas anuncia que quer fazer uma reportagem sobre a poluição na praia, sendo que contactos, informações e fotografias já foram disponibilizadas pelo ”Factual” (a solidariedade jornalística em Cascais é outra coisa!) Para grande desagrado do Sam e da Becas, as fotografias mostram Natasha e Duarte deitados na praia, provavelmente a mal-interpretar nuvens. Filipa entrega peças de vestuário à Blackout. Lucas e Lourenço metem-se um pouco com André por causa da Leonor, mas também não têm jeito e é a cena desconfortável do costume. André acaba por ir praticar bodyboard com Leonor.


Voltamos a um alegre cenário de uso de marijuana. Mick “Manel” Hucknall inicialmente recusa-se a participar, mas a provocação de Duarte, Natasha e Angelina acaba por o convencer, num cenário totalmente oposto ao dia-a-dia dos consumidores de erva na vida real (aquela merda é cara e difícil de arranjar, nada pior do que ter mais um amigo que quer cravar.) O consumo leva a regozijo geral, até que Duarte (num gesto mais próprio de quem tomou ecstasy, o que alias condiz com o seu vestuário) salta para cima do carro dum brutamontes qualquer. Este sai do veículo e faz cara de mau – só no próximo episódio saberemos no que isto vai dar, mas eu aposto em penetração anal.


(Quem quiser saber mais sobre este episódio dos “Morangos”, ou sobre a possibilidade duma política externa comum da União Europeia em geral, é aconselhado a ler as palavras de Richard Rorty na revista “Dissent”.)

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